A nossa vinculação a Deus não se insere numa visão
antropocêntrica, ela assume-se através da absoluta e incondicional presença da
eterna de Deus. Nesta presença eterna, neste dialogo fascinante e profundo, Ele
encarnou na presença concreta de um humano entre humanos, de pessoa entre
pessoas, numa relação que ao fazer-se tocar assim permanece (cf. Jo 20,27). Um
Deus que se fez homem, e que ao ser homem viveu com as fragilidades e receios
humanos, numa vida de profunda entrega e de permanente crescimento espiritual e
humano na Sua vida terrena (cf. Mc 7,26-29).
Nesta relação, que nos inquieta e nos fortalece pelo exemplo
e que nos aconchega e queima pela palavra, abre-se diante de nós a
possibilidade magnifica de fazermos parte do labor de Deus, um chamamento (“Ekklesia”)
que se espalha pelo mundo através da ação Igreja.
“Todo o bom cristão deve estar mais pronto a interpretar favoravelmente
a opinião ou afirmação obscura do próximo do que a condená-la. Se de modo
nenhum a pode aprovar, interrogue-se como é que ele a compreende; se ele pensa
ou compreende menos retamente, corrija-o com benevolência; e se isso não basta,
tentem-se todos os meios oportunos para que, compreendendo-a bem, ele regresse
do erro são e salvo”
(S. Inácio de Loyola)
Na vida comum, o exemplo de Jesus faz-nos sair de nós
mesmos, da nossa “zona de conforto”, e buscarmos Cristo através da entrega aos
outros de uma forma incondicional, sem querer reconhecimentos, nem nada de
retorno... porque tudo já nos foi dado antes. Neste trajeto filial, todos, sem
exceções, somos irmãos na presença de Deus Pai todo Poderoso.
É nesta atitude de desprendimento que fazemos dos monólogos diálogos
com os outros e com o mundo. Toda a história da salvação assenta num diálogo
permanente de Deus com os homens, uma eterna relação que se prende a um amor
original, e através deste primeiro amor libertador deveremos responder como
atores livres do na Terra, porque “de facto, foi para a liberdade que vós
fostes chamados. Só que não deveis deixar que essa liberdade se torne numa
ocasião para os vossos apetites carnais. Pelo contrário: pelo amor, fazei-vos
servos uns dos outros. É que a toda a Lei se cumpre plenamente nesta única
palavra: Ama o teu próximo como a ti
mesmo. Mas, se vos devorais uns aos outros, cuidado, não sejais consumidos
uns pelos outros.” (Gl 5,13-15).
Buscamos provas da existência de Deus,
mas Deus não se prova nas estrelas do céu, nem nos acontecimentos
tremendos e espetaculares do universo. Deus é e está em TODA a vida, daí que o
importante está em O buscarmos na vida comum, concreta e discreta; na vida que
se deixa enamorar pela beleza das coisas, que se comove com ou outros, que se
alegra com a felicidade de um irmão, porque na presença do outro está também a
presença de Deus.
A encarnação do Logos coloca-nos na própria sintonia com
Deus, num enorme e irresistível abraço entre nós e o divino, porque quem ama,
faz do amor “ascendente” a Deus, um amor “transversal” aos homens. O mistério
do Ágape de Deus, coloca-nos no caminho da nossa própria beleza interior, revista
na atitude de serviço e de dádiva aos outros, com todas as alegrias e amarguras
da fragilidade existência.
“Conheço as tuas obras. Vê, coloquei diante de ti uma porta aberta, que
ninguém pode fechar. Tens pouca força, mas guardaste a minha palavra e não
renegaste o meu nome.”
(Ap 3,8)
Deus doa-se em amor, no entanto este amor não tem uma
uniformidade em resposta humana. No entanto não pensemos que somos mais do que
os outros, porque os últimos serão os primeiros (cf. Mt 20,16). O que existe é
a diferença no acolhimento e na predisposição para o “SIM”, como tão bem nos é
apresentado no Quarto Evangelho em relação ao discípulo amado.
“Corriam os dois juntos, mas o discípulo correu mais do que Pedro e
chegou primeiro ao túmulo. Viu e começou a crer...”
(Jo 20,8)
A beleza reside nesta singularidade humana, neste o valor
humano, neste incontestável valor da vida...
“Na humanidade de Jesus se mostra a
santíssima divindade de Cristo”
(S. Inácio de Loyola)
Hoje num mundo tão imediatista, em que toda a informação
circula em pouco tempo, torna-se necessário parar e tomar a consciência de que temos
um Deus que se fez próximo, um Deus que se dá todos os dias em amor, um Deus
que é Ele mesmo amor (cf. 1 Jo 4,16), e que só em amor O podemos compreender e
estabelecer com Ele um caminho para a o Seu Reino. Um Deus que se fez homem e
através de Jesus Cristo reconhecemos o próprio Deus.
Esta consciência de que somos de Cristo e que Cristo é de
Deus, em si mesma a naturalidade da nossa filiação a Deus. O alimento de Deus é
a Salvação de todos, e a Salvação de todos liga-se profundamente com a
realização plena de cada ser humano.
Meus irmãos:
Por mais que nos esforcemos jamais poderemos determinar a
natureza (amorosa) de Deus, apenas sabemos que é amor e que no amor permanece e
que no amor se revela.
“Agora, vemos como num espelho,
de maneira confusa;
depois, veremos face a face.
Agora, conheço de modo imperfeito;
depois, conhecerei como sou conhecido.
Agora, permanecem três coisas:
A fé, a esperança e o amor;
mas a maior de todas é o amor.”
(1 Cor 13,12-13)
A transcendência surge sempre a partir do amor de Deus,
naquilo que é capaz de realizar e está além das nossas capacidade, mas embora
seja inexplicável é plenamente sentido, porque O tocamos todos os dias.
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