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sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

A RESPOSTA AO DOM É A DOAÇÃO


“Assim como o Pai me tem amor, assim Eu vos amo a vós. Permanecei no meu amor. Se guardares os meus mandamentos, permaneceis no meu amor, assim como Eu, que tenho guardado os mandamentos do Pai, também permaneço no seu amor. Manifestei-vos estas coisas, para que esteja em vós a minha alegria, e a alegria seja completa.
É este o meu mandamento: que vos ameis uns aos outros como Eu vos amei. Ninguém tem mais amor do que quem dá a vida pelos amigos. Vós sois meus amigos, se fizerdes o que Eu vos mando. Já não vos chamo de servos, visto que um servo não está ao corrente do que faz o seu senhor; mas vós chamei-vos amigos, porque vos dei a conhecer tudo o que ouvi ao meu Pai.
Não fostes vós que me escolhestes; fui Eu que vos escolhi a vós e vos destinei a ir e a dar fruto, e fruto que permaneça; e assim, tudo o que pedirdes ao Pai em meu nome Ele vo-lo concederá. É isto o que vos mando: que vos amais uns aos outros.
(Jo 15,9-17) 

Passar de mim mesmo para o outro, através de uma postura aberta e fraterna ao mundo, encontra-me com sabor da liberdade, aprimora o autoconhecimento e clareia o espírito, fazendo da vida lugar em que Deus não esteja remetido num pensamento, mas na razão efetiva da vida. Cada vez mais estou convencido que é no dar-me que melhor me conheço…
Desta forma o amor ultrapassa o afeto, mostrando que a tal “felicidade suprema” que tanto se busca, só tem uma morada: Deus.

O papel da família é assim essencial, uma criança (como já abordamos) vê esta ligação ao absoluto de uma forma natural, ela deseja ser tocada pelo conhecimento, mas também (e em maior intensidade) pelo amor. Ao apresentarmos Jesus a uma criança é abrir-lhe a mente para o transcendente.
Desta a tarefa catequética é fundamental, só com persistência em abrirmos ao jovem o exercício espiritual teremos adultos apaixonados pela espiritualidade, em que o acolhimento de Deus se apresente como um desfrute do próprio espírito (cf. 1 Cor 2,4; 1 Ts 2,13).
A obediência, infelizmente ainda hoje tão mal entendida, está na nossa acção em relação a Deus através dos outros, este é o próprio cumprimento da palavra de Deus, como o texto de S. João refere no início deste capítulo.

Olhar para o homem na sua totalidade, implica respeitar as suas singularidades, porque é no desrespeito pelo outro que se rompe a possibilidade para a realização de uma moral que seja verdadeiramente válida. Noto com tristeza que muitos que se dizem cristãos, são bem mais corajosos na crítica do que na caridade.

“Se alguém causou tristeza, não foi a mim, mas, de certo modo – não quero exagerar – a todos vós. Basta a esse homem a censura que a comunidade lhe infligiu. Agora, porém, é melhor que lhe perdoeis e o consoleis para que não sucumba ao peso de demasiada tristeza. Peço-vos, pois, que tenhais caridade com ele”
(2 Cor 2,5-8)

Com Jesus são-nos abertos sinais que ultrapassam barreiras, Ele aponta para um caminho de unidade, em que somos “compatriotas” uns dos outros, o universalismo da mensagem cristã não pode ser reduzida a grupos restritos. Mais do que modelos filosóficos que busquem a obtenção do sentido último das coisas, necessitamos, neste início de milénio, de uma filosofia que se centre totalmente no ideal do bem comum, numa razão que se enquadre na visão não do eu, mas no eu com os outros, sem qualquer tipo soberba, e sim na humildade sincera em relação a cada um, à beleza de cada um. É nesta humildade que encontraremos a própria beleza de Deus – “Felizes os pobres em espírito, porque deles é o Reino do Céu” (Mt 5,3) - que muitas vezes está na escolha de uma vida em dádiva.
Nesta abertura de espírito são-nos colocados diante no nosso horizonte os valores assentes na verdade e no amor.

Deus como fonte do próprio amor admite-nos na Sua eterna misericórdia, daí que a comunhão de todos, na realidade histórica, só é possível a partir do chamamento que nos é externo e nunca a partir das nossas capacidades limitadas, é Deus que actua no “eu” fazendo agir, vendo assim tudo de uma forma límpida e renovada. Tal como S. Paulo na viagem a Damasco (cf. Act 9,1-18), necessitamos muitas vezes de abrir a visão ao “coração”, a observar que realmente o caminho não é aquele que estamos a percorrer, mas outro que Deus nos indica (e muitas vezes sempre indicou) mas que por ser muitas vezes mais “exigente”, passamos a vida a recusá-lo.

Aceitar Deus como Deus é fundamental…

Reparemos que muitos que têm uma ideia firme de Deus, compreendendo mesmo a sua vida neste núcleo centrado a partir d´Ele, muitas vezes vivem numa angústia permanente, não aceitando a naturalidade das coisas, colocando-se mesmo na incompreensão (senão mesmo acusando Deus) da existência de manifestações naturais em desfavor do homem. Este facto acontece porque muitas vezes não aceitamos Deus como Ele é, mas sim como gostaríamos que fosse. Deus sendo Amor é também relação da abertura à liberdade.
Pessoalmente sou incapaz de compreender a totalidade de Deus porque, e como dizia S. Anselmo, “está além do pensável”, mas de uma coisa estou certo:
 ao encontramos Amor de Deus na nossa vida, leva a que a abertura de espírito ao silêncio, à oração e à contemplação seja fundamental. Mesmo nos momentos mais difíceis, ou naqueles em que mais longe Dele estou, Deus sempre se faz presente…

Na actualidade tem-se notado que tanto o relativismo como o positivismo não conseguem responder, de uma forma capaz, aos anseios da humanidade. Uma corrente de pensamento que não contemple a globalidade da pessoa (em todas as suas dimensões) nunca poderá ser caminho a ser percorrido. Uma forma individualista, em que o modelo esteja somente limitado ao “eu”, ao “eu” que decide conforme as circunstâncias ou que em circunstâncias idênticas reaja de maneira diferente é colaborar ativamente para o caos, assim como a busca somente do cientificamente comprovável torna a vida estranha, envolta num sistema em que não passaremos de um número ligado a estatísticas.

“É com o nosso egoísmo que se constroem barreiras com que nos isolamos e excluímos aqueles que nos são diferentes. (…) Seria, por exemplo, um contra-senso querermos estar unidos a Jesus e, ao mesmo tempo estarmos divididos entre nós, comportando-nos de uma forma individualista, indo cada um por sua conta, julgando-nos ou até excluindo-nos uns dos outros”
Chiara Lubich (9) 

“Nenhum homem é uma ilha”, somos seres em relação, sendo que esta permanência não se faz somente com os outros, mas também com o próprio Deus - Ele próprio é relação -. Na interiorização desta noção sentimo-nos ligados ao mistério pascal de Jesus, em que Deus atinge o Seu ápice culminando na própria compreensão de toda a Palavra que se revela na própria Pessoa de Jesus, como “Logos” encarnado, que ao cumpri-La dá a Sua vida por todos (1 Ts 5,9-10), apontando para a criatura amada o Amor do Pai.

Assim a dignidade humana é para o cristianismo um valor incontornável, ao qual não podemos jamais viver ausentes desta missão. A defesa dos direitos humanos é parte integrante da própria doutrina cristã, no entanto, no mundo ocidental criou-se “anti-corpos incompreensíveis” partindo da própria laicidade dos estados, não enquanto local de convivência, mas em lugar de permanente oposição à religião, em particular ao catolicismo. Desta forma a ética, e em particular ligada aos direitos humanos, têm sido também enquadrados dentro do positivismo. Claro que o positivismo tem ligado a si muitíssimos pontos fundamentais para o progresso da sociedade, no entanto não são as constituições, só por si, que criam a ética/moralidade. A moral tem raízes bem mais profundas, portanto enquadra-las somente dentro dos meandros positivistas leva a que a sua regulação fique extremamente estreita.

Claro, que visto neste prisma, o relativismo poderia aparecer aqui como uma solução viável, já que ao apelar à tolerância, poderia facilitar as coexistências culturais, reconhecendo assim os valores uns dos outros. No entanto o problema surge quando o relativismo, contra a sua própria natureza, se assume como “solução absoluta”, retirando fatalmente valores fundamentais da esfera ética e estruturante do ser humano. Numa acção deste tipo, somente o calculável e demonstrável, assumia-se como única noção valida, no entanto existem questões vitais, que nesta conceção, seriam colocadas num universo subjetivo, sendo mesmo questionadas e postas em causa no discurso relativista. Se somente aquilo que tem validade científica é dado como válido, e portanto factor estrutural ético, tudo o que não está dentro deste discurso entra na esfera do relativo. Assim dentro desta subjectividade colocar-se-ão questões fundamentais para o ser humano como: as decisões sobre a vida, a família e tantas outras.

Para Hans Jonas a responsabilidade social liga-se à tomada de consciência para uma nova reflexão sobre os princípios da ética. A responsabilidade tem de se centrar, não somente no âmbito da nossa acção na busca de respostas, mas também num conhecimento enquanto elemento integral e vital na acção individual. No entanto esta acção não pode somente visar o indivíduo (na sua condição puramente individual), mas sim enquadrada num contexto que vise a utilidade global. Uma acção que esteja atenta, batendo-se contra possíveis fatores que potenciem as injustiças e malefícios para o mundo, é uma ação realmente responsável na construção de um caminho de coesão e integração social.

Ter uma consciência cristã da realidade concreta da vida, não trás consigo facilitismos, quem assim achar está enganado, a exigência que nos é pedida por Cristo é muitas vezes envolta em renúncias e em entramos muitas vezes em caminhos difíceis, mas no que entanto são nestas renuncias e caminhos que encontraremos as verdades para uma sociedade nova, onde o seu fim aponte para a felicidade comum.

Já no Génesis com Adão e Eva, notamos que o homem tenta sempre ultrapassar Deus. O fato de sermos à “semelhança de Deus” (cf. Gn 5,1), não nos faz deuses, faz-nos capazes de relacionarmos com Ele, é o nosso espírito e também a inteligência que nos faz capazes de Deus.
Em Cristo esta relação, esta Aliança renova-se e torna-se Comunhão, uma comunhão baseada no amor e na misericórdia eterna. É impossível separar a Sua existência da Sua Palavra, Ele nunca deixou de se fazer presente na vida comum, na missão por revelar a verdade realizou-o num prefeito contexto histórico. Este mistério de Deus, que nos acompanha na história, eleva-nos a criatura amada.
Esta presença permanente de Deus sempre me tocou profundamente, não tendo mesmo palavras para explicar esta tão grande maravilha, no entanto a Sua proximidade é sentida profundamente. Deus jamais nos abandona, a Sua acção faz-se continuamente na história, o Seu Espírito está sempre actuando e interpelando-nos a Ele, porque só Nele nos completaremos e veremos tudo de uma forma completa:


“«Desperta, tu que dormes
levanta-se de entre os mortos,
e Cristo brilhará em ti»”
(Ef 5,14)
      


Na realidade noto que muitos buscam na sua acção cultual uma relação extremamente egocêntrica, em que todo vá ao encontro apenas dos seus desejos, deixando de parte o compromisso da comunhão. Tudo se concentra em desejos pessoais, muitas vezes imediatistas, levando, perigosamente, a própria religiosidade para uma dispersão, aparecendo, deste modo, como uma “fuga” pseudo-contemplativa da realidade, concentrando tudo em si e muito pouco nos outros. É necessário buscar Deus como aspiração à comunhão, assim ao sermos passivos à entrada d´Aquele que nos interpela e nos “ilumina” (Cf. Jo 14,6), a comunhão orienta-se numa entrega total para Deus. Amar Deus é deixarmo-nos entregar nos Seus “braços”, em que a nossa vida terrena seja uma permanente busca pelo Senhor, que é a fonte da própria virtude.
Nesta vida atual alheamo-nos muito de Deus, buscando apenas a satisfação pessoal (muitas vezes materialista), como sentido de vida, em que tudo se remete aos anseios momentâneos comandados por tendências pouco interessadas na verdade, mas na pura satisfação de desejos, e muito pouco da consciência. Isto paralisa o homem, e com ele a própria sociedade, já que deixa de pensar o futuro de uma forma construtiva, remetendo-se apenas em responder ao momento, muitas vezes com pouca reflexão e aprofundamento consciente das coisas.

Assim no contexto da crença, nunca deveremos estar em antagonismo com as verdades da razão, da filosofia, da ciência, da história e da própria ética. O racionalismo é sempre um caminho ao qual se deve estar atento, no entanto este facto muitas vezes leva a que se retire o “coração” nesta busca da verdade das coisas. A relação com Deus tem sempre consigo um mistério, uma atracção que se fortalece na fé e que nos faz contemplar. A fé ilumina a razão, no entanto ela reside no Senhor, nesse “fogo” que nos atinge no coração (cf. Lc 24,32) e que nos leva a fazer caminho colocando-nos nos “braços de Deus”. Não nos deixemos somente levar por um caminho em que tudo tem que ser comprovado, deixemo-nos ser tocados pelo Senhor. Uma visão somente voltada para o resultado, para a prova de tudo, leva ao empobrecimento da natureza das coisas, a razão não está somente com o positivismo, remetermos todas as realidades neste nível podemos sem dúvida aumentar o saber, mas não a nossa sabedoria.
A negação da necessidade do transcendental fez com que o homem se achasse mais autónomo, no entanto, ao contrário do que seria expectável não trouxe a sua realização suprema, colocando-o num estado de permanente angústia. A noção cristã insere o homem na sua mais plena liberdade, em que a vivência se torne fecunda. Fazer do culto cristão uma burocracia ou mesmo um ritualismo sem a adesão espiritual, é liquidarmos a beleza da boa nova, dada por Cristo, o “logos” encarnado, Aquele que nos mostrou o alcance da Palavra. Embora não partindo da mesma substancia de Deus, somos criatura amada por Deus, criados “à Sua imagem e semelhança” (cf. Gn 1,27; 9,7). O homem necessita de Deus, Ele é a razão da existência, esta necessidade provoca a resposta, sendo que esta tem que se enquadrar sempre no amor, porque é no amor que Deus que se revela; assim e através desta relação a “pneuma” abre-se, levando a que a concretização da resposta seja total - “Não tenhais medo! Abri as Portas a Cristo” (11) - sem receios mas como a causa última e fundamental da nossa existência, numa relação que se concretiza da própria história individual e coletiva.


A unicidade absoluta de Deus, que se une à humanidade de Jesus, para aparecer, serve-se da relativa unicidade dada pelo fato de esta personalidade histórica ser homem (…) É-se, pois, forçado a dizer que, porque Jesus é verdadeiro homem e valor universal e abstrato das leis fundadas na natureza humana participa nele na sua assunção na união com a pessoa do Verbo divino” 



A contemplação de Deus contempla toda a criação, criando-se assim uma atracção (“Eros”) que caminha em direcção ao amor (“Ágape”), só no amor encontramos Deus, porque Deus é isso mesmo: Amor (Cf. 1 Jo 4,8). Daí que a caridade seja realmente uma questão essencial e fundamental de todo o cristianismo, não devendo somente estar nos meandros da retórica, mas como forma central de toda a vivência Cristã.
Toda a Sagrada Escritura visa a salvação pelo amor, Cristo não foi crucificado por capricho de Deus Pai, na paixão aparece-nos Jesus a demonstrar de uma forma extrema o amor de Deus.

A divinização de realidades imanentes ao mundo tem colocado o homem na constante perca da sua liberdade, ficando escravizado pela própria realidade… Aceitar Deus como realidade transcendente e diferente do mundo, faz com que nos libertemos das realidades mundanas e nos elevemos em direcção da verdade, que anima a vida e lhe dá um sentido de beleza ao qual não nos podemos alhear. Só num “olhar” para Deus como Deus é que nos leva (aqui sim) a relativizar a nossa própria realidade, e tenham a certeza: passamos muito mais tempo no redor de futilidades do que na entrega à busca daquilo que é essencial.

Mesmo aqueles que rejeitam o sentido de Deus, ou mesmo negam a sua existência, não deixam notar que o futuro da humanidade está ligado a uma responsabilidade “superior” assumida pelo sujeito resultando assim no equilíbrio da de toda a existência. A responsabilidade ética deverá assentar na promoção de princípios coerentes como a preocupação centrada numa praxis (social, económica e política) com a experiência do serviço inserida, não como voluntariado (esporádico), mas sim numa posição apostólica em relação a todas realidades. Todo o serviço deverá ser realizado através de uma orientação intelectual, moral e emocional, em que o foco resida sempre no outro. A “purificação” através do encontro com a ética resulta “num deixar ir” com responsabilidade, numa postura de abertura sem que no entanto percamos a nossa racionalidade humana, exaltando uma expressão assente na promoção da justiça e fraternidade entre todos.
Neste sentido aparece a conversão, sendo que para muitos será mesmo mudar de forma radical a sua forma como encara a realidade, contribuindo assim para uma mudança do mundo, desistir desta postura é “cair” na ignorância, medo e desespero.
    
Não tenhamos dúvidas que o homem contemporâneo nega a existência de verdades absolutas. É pois urgente superar este racionalismo unilateral e encontrar a razão da vida, numa concepção mais ampla da consciência, buscando mais a sabedoria humana do que o saber restrito a uma realidade concreta.
A razão sustentada pela fé é a base da natureza moral cristã, no entanto, aqueles que não têm fé ao apoiarem-se na natureza humana provida de razão como indicativa para um comportamento ético é importante e positivo, porque neste contexto a posição da Pessoa aparece claramente dignificada. Assim o caminho entre crentes e não crentes no desenvolvimento de uma civilização viável deve assentar na fundamentalmente na dignificação da liberdade do individuo como Pessoa, respeitando todas as suas dimensões.

Esta relação com o outro talvez nos torne mais exigentes, já que na visão cristã o “logos” mostra-nos claramente o conceito de justiça enquanto ato supremo da misericórdia divina pela humanidade. A moral assenta no Senhor, fonte de vida eterna (cf. Jo 4,13-14), que através do Seu testemunho chama-nos a esta moral em todas a realidades do mundo.
Hoje em dias somos confrontados com realidades especulativas nas mais diversas realidade, reparemos que as especulações dos mercados financeiros não estão somente nesta oposição à moral cristã, como também na própria numa contraposição de conceitos éticos que visem a dignidade total, já que a ela está subjacente na maior partes das vezes algo ao qual não faz parte da nossa forma de estar no mundo: a mentira, e onde esta se encontra NUNCA se encontra Deus.

Muitas vezes testemunho certas manifestações de uma suposta “moral cristã” que mais não são do que a exposição de sentimentos egoístas (em relação a Deus e ao mundo) e mesmo recriminatórios, em que o olhar para o outra é realizado de uma forma fria e inserida em anseios pessoais, em que na realidade pouco ou nada apontam para o Senhor, centrando-se num moralismo exclusivista e perigoso, já que entra nos meandros do maniqueísmo o que retira beleza e abrangência à mensagem de Cristo descrita nos Evangelhos. O fato de buscarmos o outro, não nos leva à relativização de valores, mas sim partindo das noções básicas cristãs saibamos encontrar a força para sermos testemunhas de novos caminhos, numa postura de exemplo – Cristo não se remeteu à retórica, Cristo disse e fez -. Quem vai com uma fé esclarecida e de coração aberto encontrará sempre as respostas para as situações a que a vida nos vai colocando, quem sustenta a sua fé em “areia” fecha-se no seu mundo, em que apenas entrarão os que lhe agradarem. Estes caminhos na busca de supostas “purezas” sempre estiveram presentes na história da Igreja, retirando-lhe a sua função essencial: Servir.


“Quem diz: «Eu conheço a Deus», mas não guarda os Seus mandamentos, é mentiroso, e a verdade não está nele” (1 Jo 2,4).





A ligação primária à lei natural, aceite por muitos não crentes, é realmente o ponto de partida para um diálogo que urge cada vez mais, já que não se fica somente nos meandros positivistas, sendo que notoriamente há a noção da existência de algo mais profundo e mais orientado ao homem do que uma posição encerrada no interior do comprovável. Reparemos que um Estado, só por si, não dá todos os direitos, nós temos direitos “transcendentes” anteriores à “imanência” do Estado. O direito natural tem pois uma posição mais elevada do que os próprios direitos humanos, sendo que estes devem servir para que possamos ter a legitimidade de nos opor às injustiças, assim a própria formação das constituições tem de se apoiar neste direito natural.

Ao contrário do que muitos pensam, “Deus não se impõe, Deus propõe-se e interpela o nosso coração e o coração de todos os homens”. Deus ao manifestar-se em nós leva-nos a transbordar para fora o Seu amor doado, não só na manifestação de amor que Lhe prestamos, mas também no amor revelado e concretizado em relação ao próximo, elevando assim a humanização do mundo. Fazer do encontro com o outro lugar central para o encontro com o próprio Deus é fundamental, daí que a disponibilidade ao serviço a quem precisa é fator identificador de todo o cristão.

Infelizmente, e como afirma Groys, “vivemos numa regra democrático-individualista, em que cada pessoa é, em si mesma, um «estado totalitário»”, este é pois a descaracterização da pessoa, colocando-nos no puro egoísmo. A moral ausenta-se da sua profundidade, já que todo é confinado à própria noção individual da realidade, legitimando deste modo todas as tomadas de posição, não visando valores absolutos, mas sim interesses pessoais contidos dentro de um espaço temporal ínfimo, do estilo: “é bom enquanto durar e me satisfazer, porque assim que deixar de me interessar descarto”. Esta noção egocêntrica do mundo leva a que as próprias relações interpessoais também se relativizem, não apostando em compromissos mas em satisfação pessoal, não existindo espaço para o perdão e para o sacrifício (num sentido renovador e nunca de holocausto), já que “sacrificar-se pelo noutro será visto como um absurdo”… 




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