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quinta-feira, 17 de outubro de 2013

Não percamos a racionalidade das coisas... mas também não nos fechemos à transcendência


No contexto da crença, nunca deveremos estar em antagonismo com as verdades da razão, da filosofia, da ciência, da história e da própria ética. O racionalismo é sempre um caminho ao qual se deve estar atento, no entanto este facto muitas vezes leva a que se retire o “coração” nesta busca pela verdade das coisas. A relação com Deus tem sempre consigo um mistério, uma atracção que se fortalece na fé e que nos faz contemplar. A fé ilumina a razão, no entanto ela reside no Senhor, nesse “fogo” que nos atinge no coração (cf. Lc 24,32) e que nos leva a fazer caminho colocando-nos nos “braços de Deus”. Não nos deixemos somente levar por um caminho em que tudo tem que ser comprovado, deixemo-nos ser tocados pelo Senhor. Uma visão somente voltada para o resultado, para a prova de tudo, leva ao empobrecimento da natureza das coisas, a razão não está somente com o positivismo, remetermos todas as realidades neste nível podemos sem dúvida aumentar o saber, mas não a nossa sabedoria. A negação da necessidade do transcendental fez com que o homem se achasse mais autónomo, no entanto, ao contrário do que seria expectável não trouxe a sua realização suprema, colocando-o num estado de permanente angústia. A noção cristã insere o homem na sua mais plena liberdade, em que a vivência se torne fecunda. Fazer do culto cristão uma burocracia ou mesmo um ritualismo sem a adesão espiritual, é liquidarmos a beleza da boa nova, dada por Cristo, o “logos” encarnado, Aquele que nos mostrou o alcance da Palavra. Embora não partindo da mesma substancia de Deus, somos criatura amada por Deus, criados “à Sua imagem e semelhança” (cf. Gn 1,27; 9,7). O homem necessita de Deus, Ele é a razão da existência, esta necessidade provoca a resposta, sendo que esta tem que se enquadrar sempre no amor, porque é no amor que Deus que se revela; assim e através desta relação a “pneuma” abre-se, levando a que a concretização da resposta seja total - “Não tenhais medo! Abri as Portas a Cristo” (11) - sem receios mas como a causa última e fundamental da nossa existência, numa relação que se concretiza da própria história individual e coletiva.“A unicidade absoluta de Deus, que se une à humanidade de Jesus, para aparecer, serve-se da relativa unicidade dada pelo fato de esta personalidade histórica ser homem (…) É-se, pois, forçado a dizer que, porque Jesus é verdadeiro homem e valor universal e abstrato das leis fundadas na natureza humana participa nele na sua assunção na união com a pessoa do Verbo divino”
Toda a Sagrada Escritura visa a salvação pelo amor, Cristo não foi crucificado por capricho de Deus Pai, na paixão aparece-nos Jesus a demonstrar de uma forma extrema o amor de Deus.
A divinização de realidades imanentes ao mundo tem colocado o homem na constante perca da sua liberdade, ficando escravizado pela própria realidade… Aceitar Deus como realidade transcendente e diferente do mundo, faz com que nos libertemos das realidades mundanas e nos elevemos em direcção da verdade, que anima a vida e lhe dá um sentido de beleza ao qual não nos podemos alhear. Só num “olhar” para Deus como Deus é que nos leva (aqui sim) a relativizar a nossa própria realidade, e tenham a certeza: passamos muito mais tempo no redor de futilidades do que na entrega à busca daquilo que é essencial.

Mesmo aqueles que rejeitam o sentido de Deus, ou mesmo negam a sua existência, não deixam notar que o futuro da humanidade está ligado a uma responsabilidade “superior” assumida pelo sujeito resultando assim no equilíbrio da de toda a existência. A responsabilidade ética deverá assentar na promoção de princípios coerentes como a preocupação centrada numa praxis (social, económica e política) com a experiência do serviço inserida, não como voluntariado (esporádico), mas sim numa posição apostólica em relação a todas realidades. Todo o serviço deverá ser realizado através de uma orientação intelectual, moral e emocional, em que o foco resida sempre no outro. A “purificação” através do encontro com a ética resulta “num deixar ir” com responsabilidade, numa postura de abertura sem que no entanto percamos a nossa racionalidade humana, exaltando uma expressão assente na promoção da justiça e fraternidade entre todos. 
Neste sentido aparece a conversão, sendo que para muitos será mesmo mudar de forma radical a sua forma como encara a realidade, contribuindo assim para uma mudança do mundo, desistir desta postura é “cair” na ignorância, medo e desespero.

Não tenhamos dúvidas que o homem contemporâneo nega a existência de verdades absolutas. É pois urgente superar este racionalismo unilateral e encontrar a razão da vida, numa concepção mais ampla da consciência, buscando mais a sabedoria humana do que o saber restrito a uma realidade concreta.
A razão sustentada pela fé é a base da natureza moral cristã, no entanto, aqueles que não têm fé ao apoiarem-se na natureza humana provida de razão como indicativa para um comportamento ético é importante e positivo, porque neste contexto a posição da Pessoa aparece claramente dignificada. Assim o caminho entre crentes e não crentes no desenvolvimento de uma civilização viável deve assentar na fundamentalmente na dignificação da liberdade do individuo como Pessoa, respeitando todas as suas dimensões.

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A contemplação de Deus contempla toda a criação, criando-se assim uma atracção (“Eros”) que caminha em direcção ao amor (“Ágape”), só no amor encontramos Deus, porque Deus é isso mesmo: Amor (Cf. 1 Jo 4,8). Daí que a caridade seja realmente uma questão essencial e fundamental de todo o cristianismo, não devendo somente estar nos meandros da retórica, mas como forma central de toda a vivência Cristã.

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